GREVE, UM DIREITO CONSTITUCIONAL
O senhor Dutra resolveu publicar sua opinião sobre a greve
recentemente deflagrada na UFU, enviando uma carta ao Correio (Jornal Correio). Sua intenção é
acusar a greve de ter motivação ideológica. Que problema há, Sr. Dutra, no fato
de uma greve ser ideológica? Absurdo seria se não o fosse.
Ser ideológico significa apresentar um conjunto de ideias e
princípios com que se pretende explicar, descrever e justificar um sistema
político de uma sociedade, vigente ou a vigorar. Todos os nossos atos sociais
são ideológicos. Ser ideológico não é crime. É ser crítico. E acreditar numa
determinada concepção de sociedade preferencialmente justa.
A carta do Sr. Dutra é francamente ideológica. Dela, emana
uma concepção de sociedade autoritária como se a sociedade fosse um quartel.
Diante de qualquer crise, sua reação é pela reprimenda, pela repressão, pela
punição dos que lutam por um projeto nacional inclusivo e igualitário.
Após quatro séculos dominando a escravaria e mais um explorando seus empregados, boa parte da classe dominante brasileira tem grande dificuldade de lidar com o questionamento de sua ideologia conservadora e elitista. Não estão acostumados a ser contrariados. Acreditam que o povo deve obedecer ao governo e pronto! Em seu projeto de nação, nem moderna, nem democrática, nem republicana, a casa-grande não inclui a senzala e a periferia.
Mas a democracia é o governo do povo. Dele emana e em seu
nome será exercido. Não é assim que se escreveu na constituição? Então, é o
governo que deve ouvir o povo, para saber que ideologia a sociedade quer ver
valorizada. Para isto serviriam as eleições, se houvesse debate sobre projetos
políticos, se fossem mais que um engodo eleitoreiro, dada incúria de muitos
candidatos e eleitores. E, juntos, governo e povo devemos obedecer à constituição.
Fazer greve não é crime. Quando diz que quer a
regulamentação do direito de greve, o Sr. Dutra certamente está pensando em
normas que criminalizem as greves. Quando pede ao governo que corte nossos
salários, o Sr. Dutra está, apenas, alimentando suas pulsões punitivas e
bárbaras.
A UFU está em greve porque se reconhece como um patrimônio
cultural estimável da cidade e do país e porque não quer se deixar dilapidar,
transformando-se numa universidade privada qualquer, destas que demitem
professores e fecham cursos a todo momento, sem formar massa crítica, ao sabor
das benesses do mercado. Queremos que o dinheiro que o brasileiro paga em
imposto seja usado para financiar uma educação de qualidade, oferecida ao nosso
povo sem a cobrança de mensalidade, em vez de ir para a mão de empresários que
comercializam com a educação ou, pior, para o ralo da corrupção.
Eduardo José Tollendal
Professor UFU
edutollendal@gmail.com